O Brasil alcançou em setembro sua maior arrecadação tributária da história, com R$ 216,7 bilhões em receitas federais — crescimento real de 1,43% em comparação com setembro de 2024 e maior valor desde a série histórica iniciada em 1995. No acumulado de janeiro a setembro, a arrecadação totalizou R$ 2,105 trilhões, também um recorde histórico com elevação real de 3,49%, contrastando dramaticamente com a crise de endividamento familiar que assola a população brasileira.
Crescimento Arrecadatório Impulsionado por Reformulações Tributárias
O destaque na arrecadação excepcional de setembro foi o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), que gerou receita de R$ 8,4 bilhões, representando crescimento real de 33,42% em relação ao mesmo mês do ano anterior. A Receita Federal atribuiu este desempenho aos decretos 12.467/25 e 12.499/25, que modificaram a legislação tributária. O aumento abrangeu operações relativas à saída de moeda estrangeira e operações de crédito destinadas a pessoas jurídicas, após decisão do Supremo Tribunal Federal que manteve parcialmente as elevações de alíquotas.
O Imposto de Renda Retido na Fonte sobre capital (IRRF-Capital) somou R$ 10,515 bilhões em setembro, registrando crescimento real de 10,21% em relação a setembro de 2024. A arrecadação previdenciária cresceu 1,49%, totalizando R$ 58,164 bilhões, explicada pelo avanço de 6,66% na massa salarial real e aumento de 20,89% nas compensações tributárias. Estes resultados positivos permitem que o governo aproxime-se de sua meta de déficit primário zero em 2025, embora projeções da equipe econômica do ministro Fernando Haddad estimem um déficit de R$ 30,2 bilhões.
Crise Profunda de Endividamento e Inadimplência Familiar
Concomitantemente ao sucesso arrecadatório, as famílias brasileiras enfrentam situação de endividamento estruturalmente crítica. Em setembro, 79,2% das famílias relataram possuir dívidas a vencer, representando o maior nível desde outubro de 2022. A inadimplência atingiu 30,5% das famílias — o maior índice desde o início da Pesquisa de Endividamento e Inadimplência do Consumidor (Peic) em 2010.
O indicador mais alarmante revela que 13% das famílias afirmaram carecer completamente de condições financeiras para solver suas dívidas atrasadas, renovando o recorde histórico. Entre os inadimplentes, 48,7% acumulam atrasos superiores a 90 dias. O comprometimento médio da renda familiar com obrigações de dívida atingiu 29,3%, com 18,8% das famílias canalizando acima da metade de seus rendimentos para quitação de débitos. As famílias de menor renda — até três salários mínimos — sofrem especialmente, embora a fragilização financeira também atinja estratos de renda superior.
Projeções Desalentadoras para Encerramento do Exercício
Conforme análise da Confederação Nacional do Comércio (CNC), o cenário permanecerá deteriorado nos próximos meses. Especialistas projetam que “endividamento e inadimplência devem continuar avançando até o fechamento de 2025”, com expectativa de que Brasil “encerre o ano com famílias significativamente mais frágeis”. A combinação de crédito com taxas de juros elevadas, estagnação de crescimento econômico real dos salários e custo de vida em expansão permanece estruturando a fragilidade financeira doméstica.
O professor Daniel Bergmann da Faculdade de Economia, Administração, Contabilidade e Atuária da Universidade de São Paulo (FEA-USP) afirma que “a última década foi marcada por crises sobrepostas que minaram a saúde de nossa economia”. Este contexto indica que os ganhos arrecadatórios do governo federal não se traduzem em alívio para as famílias, que continuam comprimidas entre salários estagnados e crescentes custos de vida.

